Um risco, uma história de vida, uma profissão, uma descoberta a cada ponto, em cada fio e (A)Bordar o Ser.
Essas são algumas das contribuições que o Grupo Matizes Dumont traz ao utilizar a arte como linguagem, como instrumento sensibilizador para mudanças pessoais e coletivas. Ao longo dos anos muitos foram os processos vividos em oficinas durante as Rodas de Bordado – ou Bordando em Roda, que nos deram a certeza de que a arte é o caminho das transformações. Ao tocar o Ser Sensível e amoroso é possível ter uma “resposta estética, de emoção e impactar a psique do fruidor”.
A nossa prática de ensinar-aprender rompe com o aspecto apenas instrumental do ato de bordar para desenvolver as ações socioeducativas, expandindo a consciência ambiental e a autoestima. Possibilita estabelecer vínculos entre as participantes, fortalecendo-as, e agregar a cultura da paz e a prática do Bem Viver.
Contando suas trajetórias pessoais com linhas e agulhas, milhares de mulheres descobriram novas fontes de renda em projetos coordenados pelo Grupo Matizes Dumont, como o “Bordando Brasil”, em parceria com a Fundação Banco do Brasil (FBB) há mais de duas décadas em todas as regiões do país.
Nesses projetos, além dos aspectos da geração de renda e a inclusão social de cada participante pode compreender seu estar no mundo, e promover seu fortalecimento como protagonista da própria história. Muitas dessas mulheres descobriram-se capazes de dialogar com sua realidade, puderam construir coletivamente espaços de confiança, compartilhamento, diálogos, solidariedade.
Mais que capacitar mulheres para o bordado, encontrar caminhos de transformação.
Acreditamos que “ao se produzir arte e ao dela se apropriar, funções psicológicas dos sujeitos também são formadas e desenvolvidas”, como é colocado por Sonia Barroco e Superti ao analisar as contribuições da Psicologia da Arte à luz de Vygotsky. Partindo dessa colocação podemos afirmar que a arte é um dos caminhos para a compreensão da realidade, despertar sentimentos favoráveis para as transformações e ampliar o poder de resiliência de pessoas.
Esta proposta vem sendo vivida e construída por nós ao longo de anos de trabalho na Educação, na Psicologia, na Saúde Pública, e amadurecida pela observação das linhas subjetivas que tomam e ganham formas reais ao bordar sentimentos, histórias de vida.
Criação de espaço educador e de partilhas.
Os fios que unem as três gerações da família Dumont se multiplicaram e se entrelaçaram a outros tantos grupos de bordadeiras criados Brasil afora por meio das oficinas, que desde 1999 já capacitaram em torno de 80.000 mil pessoas utilizando a metodologia A Bordar o Ser, desenvolvida pelo Grupo Matizes Dumont.
Trabalhando o bordado em várias vertentes, sentimos a necessidade de criar oportunidades para melhoria de qualidade de vida das mulheres e fortalecer o terceiro setor. Oportunidades de criar peças bordadas, experiência ímpar de viver as etapas que vão desde a criação de uma peça até a sua comercialização.
Em 2004, quando no Brasil tudo apontava para a pobreza extrema e diante do crescente número de pessoas com muitas dificuldades, impossibilidades de realizar seus sonhos, nasceu o Instituto de Promoção Cultural Antônia Diniz Dumont (ICAD – Brasil), o braço social da família Dumont, sediado em Pirapora- MG. Com a proposta de trabalhar as funções social, educativa, psicológica e humanizadora da arte, o ICAD – Brasil foi criado para ser um espaço de compartilhamento de ideias e ações voltadas para a cultura, educação, saúde e meio ambiente, além de resgatar antigos ofícios por meio do diálogo e do acesso a Tecnologias Sociais.
Neste lugar, onde se desenvolve mobilização e inclusão social, a comunidade de Pirapora, Buritizeiro e municípios vizinhos aprendem ofícios, convivem com a criatividade e a arte, constroem coletivamente conhecimentos importantes para a comunidade ribeirinha. É por isso que o Instituto se tornou o principal espaço de convivência dessas comunidades e referência em projetos. Atualmente, o ICAD – Brasil, executa projetos, produz artesanato, acessórios, comercializa produtos bordados dentro e fora do país. As bordadeiras do Instituto Cultural Antônia Diniz Dumont aceitaram o desafio de sempre produzirem peças únicas, belas e úteis.
A força do coletivo na história do surgimento de grupos.
Do desejo do encontro, outras rodas de mulheres continuam a surgir de Norte a Sul do país. Hoje vamos contar a história bonita de dois grupos cuja existência se entrelaça com o Grupo Matizes Dumont.
Grupo Pontos e Contos.
Imagem de vestido com bordado confeccionado por bordadeira do coletivo Pontos e ContosEm Alagoas, mais especificamente no município de Penedo, está ancorado há 14 anos, o grupo Pontos e Contos, capacitado em 2005 pelo projeto Bordando Brasil. A bordadeira Francisca Lessa, uma das criadoras do grupo, conta que comercializava seus bordados para garantir o sustento próprio antes de se formar em Agronomia.
Depois de passar pelas oficinas de capacitação (A)Bordar o Ser, em Alagoas mesmo, aprendeu o bordado livre e descobriu novas formas de expressão, diferentes do bordado clássico que herdou da mãe. Montou o grupo que hoje integra 35 mulheres, além das muitas que foram beneficiadas nesses mais de dez anos de existência.
Com sede própria e um trabalho profissional exitoso, elas espalham o que bordam em produtos diversos. “Nosso bordado tem uma identidade própria, quem bate o olho sabe que foi feito por nós”, comemora Francisca Lessa, orgulhosa ao contar que além de terem uma loja, salas para costura e bordado e um site de gestão das vendas, muitas das bordadeiras que passaram pelo Pontos e Contos montaram seus negócios autorais em outros lugares do Brasil.
Bordadeiras da Redenção – RS.
No extremo oposto do país, uma inquietude a ser expressa com a ajuda da arte motivou a jornalista Iara Maurente não só a bordar, mas a reunir pessoas que tivessem o mesmo desejo. No principal parque de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, há oito anos as bordadeiras da Redenção se encontram todas as tardes de terça-feira para bordarem juntas. Segundo Iara, “sem nenhum propósito. O grupo é um espaço de acolhimento”, explica.
Formada em oficinas realizadas na capital pelo grupo Matizes Dumont, Iara diz que o resultado do engajamento, que o bordado traz no convívio, é a capacidade de expressão. “Entre nós, cabe toda a expressão política, cabe toda a expressão emotiva. O que a pessoa quiser bordar, ela realmente borda. O bordado faz acontecer”.
Nesse espaço seguro do bordado espontâneo e livre, não há restrições.
Nem mesmo material é necessário: quando alguém chega sem agulha, linha ou tecido, tem sempre quem empreste, ensine, acolha. Não é preciso inscrição prévia, experiência anterior e assim as bordadeiras (mulheres em sua grande maioria) compartilham suas experiências de vida.
“Já descobrimos histórias de muito sofrimento que foram compartilhadas. Há espaço para tudo, para pensar, discordar, reclamar, dizer não, pensar diferente, perguntar o que nunca perguntou, declarar, silenciar”. Entre as bordadeiras da Redenção não há julgamento pela técnica do bordado. “Todo ponto tá certo, toda pessoa está certa naquilo que ela quer ser”, diz Iara.
Nem mesmo a pandemia desmobilizou o grupo, que se manteve conectado. E quando perguntamos à jornalista o que herdou da família Dumont, ela borda as palavras sem medo de errar o ponto. “A linha da família Dumont que nos agrega e é esse forte laço feminino que não exclui, permeado de afeto, que nos une. Isso que a gente aprendeu, foi o que a gente captou do grupo Matizes Dumont”.
Nossa prosa vai parando por aqui e continuará outro dia, pois conhecemos muitas histórias de grupos de bordadeiras para compartilhar – todas singulares e muito interessantes pelo que representam em suas comunidades. Temos orgulho de ter participado do seu surgimento e aos poucos vamos contar para vocês.
Brasília, 26/08/22
Que Benção, Parabéns pelo Grupo de Selhoras
Um trabalho de excelência, pois capacita mulheres que desejem desenvolver a arte de bordado manual e criarem suas vontades e desejos com linhas!
Preciso de terapia e pensei no bordado
Fantástico trabalho !!!
Através da produção manual , congrega-se pessoas , despertando para o fazer coletivo , dando novas possibilidades sociais e econômicas .Parabéns , Grupo Dumont !
Maravilha Cada traço,cada linha é uma viagem, bordar é a melhor terapia.
Não sabia desse grupo de bordadeiras da Redenção, na cidade onde moro, Porto Alegre RS.
Texto maravilhoso, obrigada!