“Ilustrar é fazer a fruta (o poema, a história) ficar gostosa de se olhar e ler; é a mágica de fazer o caldo do texto se transformar em doce, feito de linhas e cores. Ou uma aeronave de nuvens, para a grande aventura de um voo especial, a leitura.” Márcio Sampaio, em “Para o menino e as meninas de D. Antônia.Belo Horizonte, 2001.
Conectada com as palavras do querido Márcio Sampaio, ilustrar livros com bordado é forma de expressão estética-poética -afetiva que está belamente enovelada aos espaços da criação, dos sentidos e da liberdade. Alinhavada com a palavra, revela-se como linguagem para novas leituras e inserção na realidade – outras escritas com linhas do sensível e da imaginação.
Livros são encontros com sonhos, sentimentos, força, coragem, vida e histórias de um dia ou dagorinha mesmo.
O bordado e a literatura reúnem uma história rica e antiga, ambas existindo como formas de contar histórias. Na Idade Média, por exemplo, as tapeçarias, como a famosa Tapeçaria de Bayeux, eram usadas para narrar eventos históricos. Essa é a primeira ilustração com bordados que se tem notícias. É o encontro com a Vida Bordadeira, como gostava de dizer Ângela.
O bordado contemporâneo como ilustração de livros surgiu em 1974, com o livro Rebelião das Raposas do publicação do Matizes Dumont.
Nesse caminho de criar e reinventar, o bordado livre e espontâneo revive essa tradição da narrativa, mas com uma abordagem mais pessoal, subjetiva ao fazer da fruta o doce mais doce dos doces. É quando pontos e linhas são ousados movimentos na tríade mágica de cor, luz e sombra.
Ah!… E o que se passa ao ilustrar? Ao bordar sobre a narrativa de outra pessoa cria-se laços entre autor, ilustrador e leitor. Convida-se para o diálogo de uma maneira não apenas visual, mas também sensorial, criando uma relação muito especial com o objeto livro: a fluidez.
A fluidez, leveza e espontaneidade podem produzir bordados onde a linha parece “dançar” sobre o tecido ou o papel, guiada pela imaginação solta, pelos sentidos e sentimentos. Para o leitor ou observador, essa expressão visual carregada de emoção amplia a leitura e permite um interagir com o texto que vai além das palavras.
Ao bordar um livro, não estou reinterpretando a história, mas reinventando e fazendo garatujas com as linhas e pontos despercebidos do bordado, aprofundando entendimentos, criando um vínculo com o texto em uma nova expressão.
No Dia Nacional do Livro, leituras e escritas nos convidam a transitar pelas nossas ilustrações. Nelas, linhas e letras do bordado vão além da representação visual porque são uma das formas de linguagem da arte que combina a narrativa, a expressão manual, emoções, afetos.
O tempo ainda é de bordar e tecer narrativas poéticas, afetivas, têxteis!
Brasília, 29/10/2024
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